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Turismo Místico em Piriápolis

25 fevereiro Marcia Cruz 0 Comments


Quem era Piria, esse personagem enigmático da lenda?

Considerado o primeiro promotor turístico do Uruguai, Francisco Piria (filho de um suíço radicado no Uruguai), ficou órfão e foi para a Itália para ser educado por seu tio jesuíta. Quando ele retornou ao Uruguai aos 16 anos, imediatamente iniciou sua longa e bem-sucedida jornada. Audacioso, engenhoso e criativo, o jovem empresário gerou várias indústrias no território (mineração, extração de pedra, vinificação), fundou mais de 70 cidades no país, foi jornalista, escritor, publicitário, filósofo, ocultista e comunicador eficaz. Construiu portos, palácios, castelos e redes ferroviárias, tornando-se, na juventude, o homem mais rico do Uruguai. No início da década de 1890, Piria empreendeu novos negócios; especificamente aquele que tornaria seu nome mais famoso. Em 5 de novembro de 1891, adquiriu 2.700 blocos rurais entre o Cerro Pan de Azúcar e o mar, no departamento de Maldonado. A compra desse território litorâneo, que mais tarde será conhecido como Piriápolis, começou com um passeio em uma incômoda carruagem. A plantação de milhares de árvores que cobriam toda a região entre o Cerro Pan de Azúcar e as posteriormente denominadas Cerro San Antonio e Cerro del Toro, rendeu a Piria, em 1910, uma medalha de ouro e um prêmio de 10.000 pesos que destinou à construção de uma escola (a atual “Escuela del Pueblito”). 
Fachada do Castelo de Piria com os sighthounds (cães de caça) na porta de acesso. Entre as pernas, os cães têm uma mochila e uma lebre morta. A lebre, na alquimia, símbolo da “matéria-prima”, é também conhecida como “mercúrio”. Portanto, do simbolismo, podemos supor que Piria finalmente encontrou o conhecimento elusivo que procurava.

A primeira construção planejada e realizada na área foi a residência de Piria: o Castelo, cercado por 250 hectares de vinhas e 200 oliveiras trazidas da Itália. Para aproveitar os vinhedos, instalou aos pés do Cerro Pan de Azúcar uma adega, importou barris da França, plantou 1.200.000 vinhas de 137 castas diferentes para fazer vinho e uma bebida criada pelo engenhoso empresário: cognaquina, bebida que a propaganda definiu como "efeitos medicinais". Ele também explorou a riqueza mineral que a área oferecia, criando pedreiras de granito, pórfiro e mármore. 

Sobre uma colina que domina a paisagem, com uma vista generosa de mar daquele local no meio dos 2700 hectares que chegam ao mar, e criada como sua residência permanente, com um desenho entre renascentista e medieval, evocando as vilas italianas do no final do século XIX, o jovem empresário construiu sua casa, inaugurada em 1897. Como todo castelo, em sua sonolenta atmosfera semiescura, com cômodos lindamente decorados e mobiliados com diferentes estilos da época, há sons, sombras, histórias e lendas inspiradas pela antiga residência, cheia de símbolos, plantas mágicas e evocações da Maçonaria, da alquimia e do ocultismo praticada por seu hermético dono. Há quem afirme que se perceberam sombras, ruídos estranhos e luzes que ninguém conseguiu identificar, que poderiam ser explicadas como entidades estranhas ou presenças no local, algumas delas registradas por especialistas com equipamentos adequados para tal.

O litoral foi loteado e acabado como em Montevidéu. Depois vieram os hotéis. O primeiro foi um quartel de madeira que havia servido de palco para uma exposição em Montevidéu. Piria comprou, mandou desmontar e transferiu para Piriápolis onde mandou remontar e foi habilitado como hotel em 1900. Em 1908 foi inaugurado o Gran Hotel Piriápolis (atual Colônia de Férias da Escola Primária), com capacidade para 300 pessoas. Dois anos depois, ele construiu o porto, onde levou vapores com visitantes de Buenos Aires. São 15 quilômetros de ferrovia entre Piriápolis e a estação Pan de Azúcar, por onde passam as ferrovias que chegam de Montevidéu rumo ao leste do país. A estas importantes obras devemos acrescentar a Rambla de 7 km, toda murada, pavimentada e arborizada, uma central elétrica e um conjunto de passeios públicos: Parque La Cascada, Fonte de Vênus, Fonte de Toro, o templo do Cerro de San Antonio, o Pabellón de las Rosas, La Virgen de los Pescadores, entre outros, dando forma aos poucos à sua sonhada estância termal. 

Ele investiu 15 mil pesos de ouro, o que na época significava muito dinheiro, para estimular o turismo. Em 1918, em uma brochura para a Argentina, Piria afirmava: “Os encantos de Piriápolis não se encontram em nenhum balneário do mundo e nada mais é que uma realidade palpitante e tangível. Temos viajado o mundo inteiro, visitando todas as praias mais famosas, e não encontramos nenhuma tão completa como esta. Praia mansa, fofa, coberta de areia fina de quartzo, água salgada, no meio do oceano, montanhas que beijam a beira do mar, colossais florestas sombreadas, ao lado da própria praia: você sai da água e se encontra a floresta, ou você sai da praia e você entra no hotel. Águas minerais de grande mérito e valor inestimável, que não são exploradas porque não há tempo, porque em Piriápolis não há tempo para tudo. São de 900 a 1000 homens que trabalham dia a dia o ano todo e o trabalho não visa terminar, nem vai acabar, desde que tenham fôlego e vida, pois aí a evolução criativa avança e se desdobra se multiplicando a cada dia em dia os encantos desse verdadeiro paraíso terrestre. Tudo ali tem charme, vida exuberante e sorridente. Piriápolis é a reparadora das naturezas débeis, anêmicas, cloróticas, cansadas da vida, das que querem descansar, das que sofrem de insônia, dos nervos, da surmenage, que é a doença do século”. Sem dúvida, um visionário ousado e preciso.

Com a energia imparável que caracteriza grandes e visionários empresários, Francisco Piria comprou o terreno no final dos anos 1800, desenhou um empreendimento, gerou publicidade e apostou na missão de divulgar e vender os primeiros lotes que concretizassem o seu sonho. Considerado o primeiro e grande promotor do turismo nacional, o filho de um suíço que se mudou para o país, quando ficou órfão foi para a Itália para ser educado por seu tio jesuíta, e aos 16, quando voltou ao Uruguai, iniciou seu longo e jornada de negócios bem-sucedida. Fundou várias indústrias no território (mineração, extração de pedra, vinificação), fundou mais de 70 cidades no país, foi jornalista, escritor, filósofo, ocultista e um comunicador eficaz. Ele construiu portos, palácios, castelos e redes ferroviárias, tornando-se o homem mais rico do país.

Inspirado pelas cidades litorâneas que conheceu em uma de suas muitas viagens à Europa, ele realizou seu sonho ao fundar Heliópolis. Rebatizada de Piriápolis em sua homenagem, após sua morte, a cidade mostra a personalidade enigmática de seu criador em cada esquina, em estátuas e passeios de todos aqueles que ainda preservam sua aparência de época, em muito bom estado. Interagindo hoje com uma arquitetura eclética, fachadas, ornamentos e antigos pôsteres Art Déco em cimento alisado, eles se alternam com correntes arquitetônicas mais modernas e contemporâneas, que mesmo com suas linhas mais concretas e estilizadas, não conseguem disfarçar o misterioso desenho da cidade, que se alinha com as correntes subterrâneas que a atravessam de ponta a ponta até chegar ao mar e à Rambla Costanera cujo desenho original evocava a Riviera Francesa, com bancos, luminárias e postes de alvenaria com grossos corrimãos de madeira entre eles.

Fogão a lenha esculpida no Castelo de Piria

Drago,a árvore mágica das Ilhas Canárias em Castelo de Piria


Fachada do Argentino Hotel em Piriápolis

Apesar das divergências de Piria com o governo, em 1920 o presidente Baltasar Brum lançou a pedra fundamental do que viria a ser o maior hotel da América do Sul: o Argentino Hotel, inaugurado 10 anos depois. O prédio tem 120 metros de largura, 70 metros de profundidade, 6 andares e capacidade para acomodar mais de mil pessoas. Originalmente, a cozinha do hotel, incluindo a churrasqueira e a fábrica de sorvetes, media 2.000 metros quadrados. Diz-se que os fornos da padaria abasteciam toda a cidade de Montevidéu, contava com duas câmaras frigoríficas para manter 2.000.000 de ovos frescos e cozinhas com 40 queimadores e 40 fornos. No rés-do-chão existia uma central hidroeléctrica, banhos quentes e frios de água salgada, ginásio, salas de bilhar, cabeleireiro, etc. Tudo foi importado: linho da Itália, talheres da Alemanha, vidros da Tchecoslováquia e móveis da Áustria. No hotel, os itens comprados no prazo são guardados para manter sempre o mesmo nível de atendimento e fornecimento de peças de reposição.

A fonte de Vênus

A mão da mística Piria no traçado urbano surge da misteriosa Fonte de Vênus, onde se diz que o peregrino deve caminhar primeiro no sentido anti-horário, espiritualmente e energeticamente conectado de coração a coração com a Estátua de Vênus, beber simbolicamente da Água Feminina e Masculina antes de passar para as Águas Primordiais do Conhecimento e então caminhar no sentido horário, desejando aos entes queridos e amigos bem-estar e felicidade em todos os planos: Físico, Mental, Emocional e Espiritual, preparando-nos para o Era de Aquário, onde todos devemos acordar.
Telhado em ruínas da igreja de Piria

Atingida pela exaustiva passagem do tempo, pela proximidade do sempre úmido vento marinho e centenas de tempestades por mais de 100 anos, a estrutura semi-arruinada da inacabada Igreja de Piria, que seria o centro da urbanização que havia sido cuidadosamente planejado, ainda  em pé, fica a pouca distância do Castelo. O simbolismo presente nos ornamentos que se referiam sem rodeios à alquimia impediu a sua consagração pela Cúria, que a rejeitou totalmente, situação que aparentemente levou ao abandono da obra, iniciada em 1914 e desenhada pela Escola Eiffel de Paris. Já foram recolhidos testemunhos de muitas pessoas que viram ou sentiram "coisas estranhas" ali, e é mesmo assegurado que o local está amaldiçoado, em parte devido à não consagração da Igreja Católica, certezas pagas pela lenda sobre o seu criador e crenças urbanas.
Detalhe das colunas da igreja de Piria, nunca consagrada pela Cúria
 


Fachada do Castelo Pittamiglio

Fachada do Castelo Pittamiglio

Com uma fachada que mostra desde o primeiro momento que “nem sempre o que você vê, é”, o Castelo Pittamiglio é outro dos locais de enorme interesse para o chamado Turismo Místico, que recebe milhares de visitantes todos os anos na região de Piriápolis e arredores, muitos dos quais chegam ao castelo atraídos pela personalidade enigmática do proprietário e construtor da obra única. 

Com passagens, esquinas, portas que não levam a lugar nenhum e um espaço específico dedicado aos Templários, a lenda urbana afirma que Humberto Pittamiglio foi o guardião do Santo Graal no Uruguai, fato que, embora não pudesse ser verificado, tampouco era a Igreja ele poderia refutá-lo. 

Também no local pudemos observar uma estranha chama violeta, em plena luz do dia, flamejando sobre uma das estátuas do parque. Hoje aí funciona o Universo Pittamiglio, uma experiência museológica diferente que mostra o lado da personagem enigmática onde a Maçonaria, a Alquimia, a Magia e o Ocultismo revelam a sua presença em cada recanto do impressionante conjunto.
Selo templário em Castelo Pittamiglio

Vitral com detalhes do Santo Graal em Castelo Pittamiglio

Principais solventes da Alquimia, em Castillo Pittamiglio

Fogão de mármore esculpido em Castillo Pittamiglio

Torre dos Templários no Castelo Pittamiglio

Cristo no jardim mágico de Castelo Pittamiglio



Cerro San Antonio

Também chamado em outra época de Cerro del Inglés, no seu topo Piria construiu um templo que abriga a estátua de Santo Antônio, padroeiro dos namorados, que ele trouxe da Europa. Pode-se subir de carro, pela rua que o rodeia até ao topo, ou pelos teleféricos panorâmicos que fazem o passeio desde a esplanada do Porto. É comum ver casais jurando amor diante do Santo e muitos outros agradecendo as graças recebidas, com ofertas e novos pedidos.
Do mar, a figura de Stella Maris é uma virgem feminina. Visto de trás, parece as costas de um homem, e talvez represente a dualidade conceitual homem-mulher que Piria talvez pretendesse esconder.


Virgem de Stella Maris ou dos Pescadores

Quase a meio caminho do Cerro San Antonio, está esta Virgem de Stella Maris, de braços abertos para a velha praia dos Pescadores. A Virgem pode ser alcançada pela estrada ou subindo desde o sopé da colina, por um caminho acidentado com degraus que parte da Rambla Costanera. Neste local encontra-se a Pedra Fundamental de Piriápolis e foi onde se celebrou pela primeira vez a Santa Missa por impulso de Piria.

Cerro del Toro e Altar dos Templários

Atrás da Fonte de Vênus ergue-se o Cerro del Toro, de origem vulcânica e coberto de mata nativa, que leva o nome de uma estátua de bronze que Piria ali havia colocado. Ao pé do Touro ainda existe uma estranha pedra plana que aparentemente funcionava como um altar templário, ao qual se chegou depois de subir trinta e três degraus da base do monumento. De El Toro ao topo, entre uma vegetação exuberante e fechada, há um caminho que leva ao cemitério dos índios Charrúa.

Textos: Carlos Rodríguez e Viviana Puñales
Fotos: Carlos Rodríguez e Freddy Fernández